quarta-feira, 28 de julho de 2010

Casamento Gay: O pecado preconceituoso da igreja.

Numa das entrevistas coletivas do técnico mais badalado da Copa do Mundo 2010, uma repórter americana pergunta ao Maradona se o ato de beijar os seus jogadores tinha algum significado sexual. O técnico nem esperou a repórter concluir a sua pergunta e foi logo dizendo: “Não, não, não. Eu gosto é das mulheres!” É, mas se Maradona fosse gay ficaria muito feliz com o seu país. A argentina é o décimo país do mundo a autorizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Uma vitória da diversidade!

Mas, ao contrário do que o inocente poderia imaginar, a vitória da igualdade civil foi conquistada à fórceps. A Igreja, principal adversária do projeto de lei, chamou o caso de “Guerra contra Deus”. O debate sobre a lei tomou conta de toda a sociedade, trazendo à tona o termo “casamento igualitário”, mas também versou sobre direito à herança, às pensões previdenciárias e adoção de crianças por homossexuais. Sob o argumento de que a relação entre pessoas do mesmo sexo não é natural, a igreja saiu às ruas e foi derrotada na Argentina.

Um cartaz de manifestante partidário do casamento igualitário em frente ao Senado argentino afirmava "Deus, proteja-nos dos teus seguidores". A intolerância e perseguição sofrida por aqueles que possuem orientação sexual na trilha LGBT (Lésbicas, Gays Bissexuais e travestis) demonstra o nível de conservadorismo ainda presente na sociedade moderna.

Se o Brasil ainda não chegou nesse estágio de respeito aos Direitos Civis, precisamos buscar espaços na lei para a sua efetivação. Todos são iguais perante a lei e diante de qualquer igreja/religião. Expressar tratamento discriminatório ofende a Constituição Federal (art. 1º, III, 5º, caput , e art. 3º, IV, da Constituição Federal) e é crime contra a honra.

O ordenamento jurídico garante a liberdade de associação para fins lícitos (art. 5º, XVII da CF), autorizando, inclusive, o registro civil do compromisso de uma sociedade moral (art. 114, I da Lei 6.015, de 1973). Isso significa dizer que até o momento em que consigamos romper com o preconceito e aprovemos o casamento gay no Brasil, os cidadãos podem registrar a sociedade homossexual de fato no cartório de registro civil, sob a permissão de constituição de uma sociedade com vínculo moral.

A ampla divulgação das pautas de reivindicação dos Direitos LGBT deve entrar na trilha do avanço das garantias individuais em nosso país, inclusive com a aprovação pelo Congresso Nacional da União estável entre pessoas do mesmo sexo (PL 1.151, de 1995) e a criminalização explícita da homofobia (PLC 122, de 2006).

Os cidadãos plenamente capazes tem o direito de amar a quem desejar e também o direito de registrar essa relação. A nossa sociedade precisa abrir mão de se formalizar pelo que é pecado ou não. No futebol disputamos com os argentinos, mas na luta pelos Direitos Civis, vamos perdendo de goleada. Pecado? Pecado mesmo é não respeitar alguém só porque ele é diferente.

Inferno é chamado o local onde ficam os que desrespeitam a vontade de Deus. E como se chama o lugar onde se desrespeita a vontade do ser humano? Ah, lembrei! Chamam de “Brasil”!

Rodrigo Machado

Texto publicado no site www.cinform.com.br/blog/rodrigomachado

Twitter: @orodrigomachado



sábado, 10 de julho de 2010

O livre Direito de Amar e a Nova Lei do Divórcio.


Amo, amo, amo muito! Quero casar com você! Essa frase pode significar o começo de uma linda relação de amor, um casamento. A vida a dois é linda, cheia de planos, vem os filhos, vem as contas, os compromissos, os problemas. Não há duvida. Quem vive junto vive tudo, as partes boas e ruins de um ser humano. A grande questão da vida é saber até quando a convivência tem a maior fatia do bolo positiva. Aí, como coerentemente pensou Vinícius de Moraes, deixa de ser eterno e precisa deixar de existir. Não para sumir, mas para se transformar em outra coisa. Numa outra relação, seja ela de amizade ou de paternidade, mas não precisa ser ruim.

Um amigo do sertão já doutrinava que a separação se resolve em três etapas: Os três primeiros meses o ser humano chora, chora com os pés inchados; Depois seguem mais três meses onde se chora, ainda sofre, mas os pés já estão normalizados. Depois de seis meses a pessoa já está pronta para outra. E ele ainda completa a frase dizendo “Casamento é bom, é melhor do que morrer queimado”. Uma pérola do dito popular.

O cantor Fábio Júnior respondeu ao ser questionado por tantos casamentos que teve (casado mais de cinco vezes) que só vivia a parte boa da relação. Para ele e para os milhões de brasileiros e brasileiras que pensam em dissolver o casamento e buscar uma nova história a Constituição Federal resolveu ajudar e facilitar.

Na semana passada foi aprovada no Congresso Nacional a PEC 28 de 2009, reconhecida como a PEC do Divórcio, que altera a forma como as pessoas vão dar fim ao casamento e facilita essa fase tão difícil da vida. Através da Emenda Constitucional o casal não vai precisar se “separar” judicialmente para depois entrar com nova ação de divórcio. Também não vai mais ser necessária a espera de dois anos para ajuizar a ação de divórcio direto como estava na Constituição. Agora, quem tiver interesse em se separar fará tudo em um único procedimento seja ele judicial ou extrajudicial. Resolve-se tudo em único ato e em ambos os casos com a presença de advogado.

A nova redação do parágrafo 6º da Constituição Federal exclui a separação judicial do ordenamento jurídico. A separação judicial dissolvia a sociedade conjugal, afirmando o fim daquela relação amorosa, mas impedia a existência de um novo casamento. O casal era obrigado a ficar um ano com um vínculo indesejável até ajuizar a ação do divórcio. Isso acabou.

A alteração da lei dá vida ao ordenamento jurídico, pois assume um papel de coerência com a realidade. A mudança é grande. Antes da alteração legal se o casal fizesse a separação judicial e mesmo após a sentença se arrependesse, precisaria apenas de um pedido judicial simples para voltar a dar força ao casamento. A reconciliação do casal após o divórcio somente poderá acontecer com a confecção de um novo casamento. A fase é definitiva.

De acordo com o instituto atual do divórcio, não cabe a discussão de culpa para a sua efetivação, ou seja, ao contrário da separação judicial, no divórcio, não cabe a apuração judicial se algum dos cônjuges teve responsabilidade para o fim do matrimônio. Um querendo separar, separados estarão. A discussão do processo resultaria exclusivamente sobre pagamento de pensão, guarda ou visita aos filhos e até mesmo possíveis indenizações requeridas. Se alguém quer se separar, seja qual for o motivo, ninguém poderá impedi-lo.

Vale ainda lembrar que não havendo filhos crianças, adolescentes ou incapazes o casal que decidir pelo divórcio poderá, de acordo com o artigo 1124-A do Código de Processo Civil, procurar se separar por escritura pública em cartório. Tal procedimento nem precisa de homologação judicial, ou seja, menos trabalho para a Justiça e particulares. Aqueles que se declararem pobres nem precisam arcar com os custos da escritura pública.

As mudanças deixam para os próprios envolvidos a responsabilidade sobre o tempo de amar e de separar e o de buscar um novo amor. A lei sai de campo para que o coração e a mente assumam a responsabilidade do rumo da vida de cada um. Agora, impera com mais força a vontade do cidadão. A coerência da modificação atende ao Direito de Amar, de Separar e – principalmente – o Direito de Sonhar com uma nova vida.

Rodrigo Machado é advogado.

Email: orodrigoadvogado@hotmail.com

terça-feira, 6 de julho de 2010

FOLHA DA MORALIDADE.

O Tribunal de Contas do Estado de Sergipe e a permissão para que Prefeitos não apresentem a folha de pagamento de pessoal.

No Brasil, a expressão “funcionário fantasma” sempre conviveu cotidianamente com o noticiário sobre a Administração Pública. Aliás, até já elegemos um Presidente que se intitulava caçador de tal espécie presente no Poder Público. Quando mais tarde descobriu-se que era representante dos sangradores do erário, conseguimos colocá-lo para fora através do impeachment. Tudo bem ele voltou, é senador e candidato ao governo de Alagoas, mas aí já é outra história de terror. Vamos ao que interessa!

Como saber que existem funcionários fantasmas numa determinada Administração Pública? Ou como saber se servidores públicos “amigos do rei” estão recebendo valores acima do estipulado por lei? Contratando os Caça-fantasmas (Ghostbusters)? Não, esse filme não passa na televisão da política brasileira.

É apenas através do acesso a folha de pagamento dos servidores públicos. Pois bem, o Presidente do Tribunal de Contas do Estado de Sergipe, encaminhou no ano passado, ofício aos prefeitos sergipanos, permitindo a não entrega da Folha de Pagamento de servidores por quebra ao princípio da privacidade.

Em sessão ocorrida no dia 08 de outubro de 2009, o Pleno do Tribunal de Contas deliberou por tal encaminhamento com base no artigo 5º, LX, da Constituição Federal e do artigo 7º da Lei 11.111, de 05 de maio de 2005. Após a aprovação de todos os conselheiros, ofício circular (nº 006/2009) foi enviado a todos os chefes executivos dos municípios sergipanos.

O inciso LX presente na disposição de garantias fundamentais da Constituição Federal foi utilizado pelo TCE na argumentação do ofício e – realmente - garante que “a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem”.

Além da norma constitucional posta, a Corte de Contas sergipana explicita como fundamento do aludido ofício o artigo 7º da Lei 11.111/05 que afirma “Os documentos públicos que contenham informações relacionadas à intimidade, vida privada, honra e imagem de pessoas, e que sejam ou venham a ser de livre acesso poderão ser franqueados por meio de certidão ou cópia do documento, que expurgue ou oculte a parte sobre a qual recai o disposto no inciso X do caput do art. 5o da Constituição Federal.

O posicionamento do Conselho do Tribunal de Contas oficializa um entendimento jurídico que há muito permeia os gestores públicos e traz à tona a contradição entre os princípios da supremacia do interesse público, publicidade e moralidade em confronto com a garantia individual à privacidade.

A folha de pagamento dos servidores públicos, ao contrário da idéia passada pelo Tribunal de Contas do Estado de Sergipe não é informação privada e confidencial. Ela representa algo coletivo e público e essa é a natureza jurídica que o ordenamento jurídico brasileiro lhe confere. Eis o nosso escopo de convencimento na presente argumentação textual.

A Folha de pagamento dos servidores públicos de um determinado ente federativo é, na verdade, a reunião de dados e informações sobre a remuneração e o provimento de todos os ocupantes de cargos públicos vinculados à sua competência administrativa. Significa a reunião de duas informações públicas: a nomeação de agentes estatais e a correspondente remuneração indicada pela lei.

Afora a permissão dada pela realidade ao Senado Federal, no caso do escândalo “Atos Secretos”[1], não existe nomeação sigilosa de servidor em cargo público e muito menos remuneração definida por ato unilateral ou secreto do gestor. A disposição em lista de todos os servidores em exercício (nomeados publicamente), somada às suas respectivas contraprestações remuneratórias estabelecidas em lei, formam a folha de pagamento dos servidores. Folha de pagamento é a publicação de dois atos já públicos: remuneração e nomeação.

Ninguém questiona a obrigatoriedade da necessidade de nomeação pública para que um cidadão tome posse e entre em exercício das funções públicas. Nenhum jurista vai defender a dispensa de lei para a definição da remuneração de servidores públicos. No entanto, a somatória de tais atos públicos é o que está sendo atacada na indicação do Tribunal de Contas do Estado de Sergipe.

A publicidade da apresentação da listagem de ocupantes de todos os cargos públicos e suas remunerações, a folha de pagamento, é instrumento de combate à corrupção e se qualifica enquanto procedimento de transparência do dinheiro público gasto com agentes.

O nosso ordenamento jurídico trata com firmeza os princípios da publicidade e da supremacia do interesse público sobre o privado e a Constituição estabelece em seu artigo 39, § 6º, a obrigatoriedade da publicação dos valores dos cargos públicos quando afirma que “os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário publicarão anualmente os valores do subsídio e da remuneração dos cargos e empregos públicos”.

Na Lei Federal 8.730/93, o sistema normativo vai muito mais além quando define o acesso não apenas aos valores dos “salários” devidos aos cargos e a denominação de seus ocupantes, mas autoriza a publicidade da declaração de bens e rendas de diversos agentes públicos estatais.

Segundo a lei, “é obrigatória a apresentação de declaração de bens, com indicação das fontes de renda, no momento da posse ou, inexistindo esta, na entrada em exercício de cargo, emprego ou função, bem como no final de cada exercício financeiro, no término da gestão ou mandato e nas hipóteses de exoneração, renúncia ou afastamento definitivo, por parte das autoridades e servidores públicos”, a exemplo do Presidente da República entre outros.

Ainda segundo a lei, ”o declarante remeterá, incontinenti, uma cópia da declaração ao Tribunal de Contas da União” para que tais documentos estejam a disposição e forneçam “certidões e informações requeridas por qualquer cidadão, para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou à moralidade administrativa, na forma da lei”.

Pela força da lei, qualquer cidadão brasileiro pode ter acesso à declaração de bens do Presidente da República, desde que tenha o escopo especial de ajuizar Ação Popular, porém, pelo posicionamento jurídico do Tribunal de Contas do Estado de Sergipe, as remunerações e a denominação dos servidores públicos de um determinado município sergipano podem obter o manto do sigilo absoluto.

Outro instituto legal vai na mesma trilha. É a Lei 9.504, de 30 de setembro de 2007, que estabelece normas para as eleições. Em seu artigo 11, §1º, IV, obriga a apresentação da declaração de bens de qualquer cidadão que deseje o registro de candidatura. E a Justiça Eleitoral dá ampla e irrestrita publicidade aos bens de todos os candidatos em seus sítios eletrônicos. Aqui impera o interesse público.

As palavras do Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, Doutor em Direito do Estado, Professor Wallace Paiva Martins Junior, são esclarecedoras: “No direito brasileiro, o confronto da publicidade do art. 1º, §2º, IV a VI, da Lei Federal n. 8.730/93 com normas infraconstitucionais decorrentes da intimidade e da privacidade, como o sigilo bancário e o sigilo fiscal, foi resolvido com ponderação no dispositivo legal, afastando a conclusão de sacrifício oneroso e desnecessário da privacidade, pela conformação conciliadora dos expedientes (divulgação simplificada na publicação, acessibilidade subordinada à finalidade específica e preservação do sigilo). O acesso a tais informações é necessidade do controle da legitimidade do enriquecimento dos agentes públicos, executado pelo próprio poder público ou pelos cidadãos, na qualidade de titulares do direito à probidade administrativa. E sobejam razões.[2]

Segundo o autor, a acessibilidade aos dados públicos contendo informações dos agentes estatais deve estar em consonância com um objetivo especifico. Tais informações não devem servir para a exposição pública sensacionalista, mas sim ter escopo certo e comprometido com a defesa do erário.

No momento em que a legislação obrigou ao Estado fornecer tais dados passou a surgir o direito de obtenção para o Ministério Público, para as entidades coletivas representativas dos servidores, para as associações populares e os cidadãos que possuam interesse em ajuizar ação popular.

A transparência dos dados presentes na folha de pagamento é medida que favorece o controle dos gastos públicos e combate de forma frontal a improbidade administrativa. Como se trata de saída de dinheiro público, a negativa de publicidade se transforma em aberração jurídica no Estado de Direito.

E a Lei Complementar 131 (Lei da Transparência), de 27 de maio de 2009, normatiza o presente entendimento exteriorizado, quando em seu artigo 48-A, I, afirma que “os entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso a informações referentes aos atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da execução da despesa(...) referentes ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao serviço prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento(...).

A Ministra do STF, Dra. Carmen Lúcia Antunes, conceitua a aludida questão de acesso aos dados da Folha de Pagamento dentro da regra constitucional denominada como verdade remuneratória. Tal instituto obriga à entidade estatal demonstrar quanto paga ao agente público e o que lhe é devido, sem deixar passar em branco o direito destinado ao cidadão em ter noção perfeita de quanto cada funcionário ganha e por conta de que serviço. A Ministra atribui à verdade remuneratória uma “forma de se dar ao povo ciência do quanto se gasta, como se gasta e com quem se gasta”[3] com o fito de patrocinar a fiscalização e o controle da Administração Pública.

A regra da verdade remuneratória tão ferida no documento elaborado por nossa Corte de Contas, pode ainda ter como reforço outras diversas regras do ordenamento jurídico que confirmam a definição de publicidade de atos administrativos que se revertem em passagem de recursos públicos a particulares e que não são alvos de questionamentos jurídicos, a exemplo das compras e contratos administrativos (arts. 16 e 61 da Lei n. 8.666/93), dos precatórios e das operações de créditos de fomento público a particulares[4]. Pelo exemplo, os cidadãos que vendem para a Administração pública ou vão receber dinheiro de precatórios têm seus nomes amplamente divulgados normalmente.

A medida tomada pelo Tribunal de Contas do Estado de Sergipe vai na contramão da transparência buscada pela sociedade brasileira e se reverte em medida protecionista aos maus administradores.

A transparência da atividade exercida pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário é algo que traz benefício ao estabelecimento de uma verdadeira democracia participativa e as informações públicas devem estar à disposição de todos os cidadãos e entidades que desejarem. Isso sim é respeitar o dinheiro público e favorecer a construção de um Estado cada vez mais Democrático e de Justiça.

Rodrigo Machado é advogado militante no ramo do Direito Público.

Site: www.orodrigomachado.blogspot.com

Email: orodrigoadvogado@hotmail.com

Twitter: @orodrigomachado



[1] Revelações que veículos de comunicação obtiveram sobre mais de 630 atos praticados por várias legislaturas no Senado Federal, de nomeações de parentes de senadores e camaradas, celebração de convênios para operações de empréstimos bancários mediante consignação em folha de pagamento, reembolso de despesas, e muitos outros itens, com envolvimento de cerca de 37 senadores e 02 ex-Diretores – Gerais da Casa. O detalhe, e este o motivo do impacto que as revelações têm alcançado: os atos administrativos referidos jamais foram publicados. Daí ao mote pelo qual o escândalo passou a ser conhecido – "Atos Secretos do Senado Federal".

[2] Remuneração dos agentes públicos / Wallace Paiva Martins Junior. – São Paulo : Saraiva, 2009, página 153.

[3] Carmen Lúcia Antunes Rocha, Principios constitucionais dos servidores públicos, São Paulo: Saraiva, 1999, p. 301-302.

[4] Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal considerou que não há sigilo informado pela publicidade em operações de crédito de fomento público a particulares (STF, MS 21.729-4-DF, Tribunal Pleno, rel. Néri da Silveira, 5-10-1995, m. v., DJU, 19-10-2001).

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Cuidado: Azul e vermelho piscando pode ser sinal de perigo!









O título acima vem da música de uma das representações mais criativas no cenário artístico sergipano, a Banda Reação. Dentro de seu contexto, a música alerta para o perigo que a atividade policial desperta nas comunidades carentes.
Ao contrário do que muitos pensam, esse temor não vem do cumprimento da lei, mas sim do abuso de poder que muitos trabalhadores de farda cometem nos lugares onde não chegam os holofotes da mídia.

Um caso intrigante de violência policial veio às minhas mãos. Um jovem de classe média, estudante, saiu de sua casa para comprar cigarros. Ele morava no Bairro Augusto Franco. Na saída da mercearia se encontrou com um colega de futebol de rua. O adolescente lhe pediu uma carona até o final da rua. Ele parou seu carro calmamente, o jovem saiu, entrou no condomínio e ele continuou seu trajeto. Poucos metros a frente foi interceptado por um outro carro “comum”. O homem sai de dentro falando ao celular e de forma truculenta manda ele colocar as mãos na cabeça. Pronto! Todos, inclusive ele, pensam que se trata de um assalto. Segundos depois, chegam duas viaturas da “Rádio Patrulha”. Ele é tirado do carro, recebe tapa na cara, chutes, é colocado no chão e algemado.
Depois da recepção por parte da PM sergipana, o jovem é colocado no camburão e levado para uma favela localizada em seu bairro e fica exposto ao lado de um casal de jovens. Os três são apresentados algemados como resultado da operação comandada pela Rádio Patrulha contra o tráfico de drogas. A imprensa tira fotos, filma, mas ninguém chega perto para lhe fazer uma única pergunta. Estava acuado, atônito, atordoado sem entender nada do que acontecia.

Termina o show da Polícia Militar e imprensa, o jovem é colocado sob pancada na mala de um veículo Siena da Rádio Patrulha, agora não mais sozinho, mas com a companhia do outro garoto. Algemados, os dois se apertam e recebem spray de pimenta com o porta-malas ainda fechando. Um ato de crueldade sem tamanho.
Foram levados para a sede da Rádio Patrulha. Lá ficaram presos sem imaginar o que poderia acontecer com as suas vidas. O medo e a incerteza tomavam conta da consciência. Passados mais de quarenta minutos, entra um policial e lhe entrega a chave do seu carro e diz que ele está liberado. O casal também foi solto. Ninguém foi levado para delegacia alguma. Ao chegar em casa, a notícia havia se espalhado. Todos o procuravam.
O pior havia passado. Viria agora o muito pior. No dia seguinte, no noticiário televisivo, a matéria anuncia a prisão de uma quadrilha de traficantes na favela do Augusto Franco. O estudante é mostrado de frente em todos os seus aspectos, algemado e sem camisa. Uma imagem que reproduz uma condição de desleixo, maltrapilho, uma imagem para acabar com sua honra. A partir daquele instante seu rosto é o de um traficante. Ele foi denunciado, julgado e condenado à pena de exposição pública e lesão corporal pela Rádio Patrulha sergipana.
A atividade policial não pode ser tratada como algo impossível ao respeito dos Direitos Humanos. A polícia não pode se afastar do seu principal objetivo que é garantir o respeito ao ser humano. Agindo assim, a atividade policial reforça o medo que vem criando ao longo dos anos. Não é por nada que uma criança de 12 anos, relatando a sua história na música Mágico de OZ, da banda de rap Racionais Mc´s, clama: “O meu sonho? Estudar, ter uma casa, uma família. Se eu fosse mágico? Não existia droga, nem fome e nem polícia."

Rodrigo Machado é advogado e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SE.